domingo, 6 de março de 2011

Nos últimos meses tornei-me um revoltado incondicional com o senso comum.

Tenho procurado peças que destoem do mar de baboseiras que a indústria midiática cotidianamente nos oferta.

Nesse sentido deparei-me com dois filmes que merecem atenta observação:

- O filme "A marselhesa" de Jean Renoir:

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Trata-se de um filme "menor" na obra deste excelente diretor (filho do pintor Auguste Renoir). Seu enredo retrata a revolução francesa sob um ponto de vista popular. Nada demais não fosse um filme de 1937. Excelente por sinal.

- O Filme "A classe operária vai ao paraíso", de Elio Petri:

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Bastaria dizer que este filme mereceu a Palma de Ouro de Cannes. Mas vale dizer que é uma obra atual por tratar da sedução do consumo e da vida burguesa agindo sobre lideranças sindicais. Qualquer coincidência é mera semelhança.

São duas obras interessantes. A informações adicionais sobre ambos pode ser facilmente identificada no Google e na Wikipedia.

Um abraço,

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

O paradoxo Estamira



Aqueles que ainda não assistiram ao documentário "Estamira" devem escolher um dia calmo para, sem muita pressa, permitir aos olhos e à mente alguns momentos de êxtase poético captados pelo diretor Marcos Prado.

Não falarei aqui da sinopse do filme. E prazeres subjetivos à parte, fica a pergunta: Estamira continua trabalhando no lixão???

Lixão e aterro sanitário nem de longe são sinônimos. Nos idos tempos de 1992 quando, no ensino médio, resolvi estudar Saneamento no CEFET-MG o inesquecível professor Telson Crespo fazia questão de pontuar esta diferença. No aterro sanitário a deposição dos resíduos sólidos urbanos é realizada em células biodigestoras que permitem a decomposição natural dos materiais com relativo controle dos gases e líquidos (chorume) produzidos. Reduz-se o problema.

Pois bem, que fique registrado que o que vi mais se assemelha a um lixão, aquilo não é um aterro. Digo isto menos pela preocupação ambiental e mais pela social.

Isto porque enquanto nos deliciamos com as metáforas que naturalmente defluem do caudaloso encontro de um cenário tétrico e monumental com uma personagem louca, Estamira segue padecendo em um muito bem enredado problema sócio-jurídico-ambiental-assistencial.

Pouparei a todos da explicação dos aspectos sociais, jurídicos, ambientais e assistenciais a que me referi e me bastarei na exposição de apenas uma faceta do problema. Chamarei-o de "paradoxo Estamira".

Estamira é louca. Também sou, mas vou considerar que o fato dela ter merecido ser protagonista do documentário seja indicativo de que o grau se seu transtorno possa ser maior do que o meu. Dirão meus detratores que me engano neste particular. Mas é que Estamira, portadora de necessidades especiais, fas jus a serviços públicos próprios pois vivemos em um Estado Social Democrático de Direito. Não é que ela não foi ajudada, o Estado descumpriu seu direito. Como Estamira é louca mas não é boba, descolou um trabalho pois, caso contrário, morreria de fome. Imagine então que este trabalho constitui-se numa segunda violação aos direitos de Estamira. Sobrevivendo de seu trabalho Estamira diz amar o que faz. Mas ocorre que este trabalho depende da manutenção de um grande problema sócio-ambiental: a catação de lixo tacitamente autorizada pelo Estado (Município) em seu imóvel e empreendida por nossa personagem e dezenas de colegas.

Pois bem, o paradoxo é o seguinte: se o Estado resolve o problema ambiental, que será de Estamira sem seu lixão? Se lhe arranjam outro emprego, que será de Estamira sem a rotina com a que se adaptou? Se lhe dão um Benefício de Prestação Continuada, de um salário mínimo, que será de Estamira sem o que fazer durante o dia? Afinal, se a colocam num hospício, que será de nossa moral sem Estamira?

domingo, 13 de janeiro de 2008

Entreatos e os bastidores do poder


O documentário 'Entreatos' do João Moreira Salles é imperdível para todos que gostam de política e história.

No início da fita o diretor explica que de todas as imagens gravadas no período final da campanha do então candidato Luis Inácio Lula da Silva, as que se revelaram mais interassantes do ponto de vista documentarístico eram justamente aquelas normalmente não reveladas, os bastidores, os descansos e preparativos entrecortados às aparições públicas do personagem.

A partir destes registros duas dimensões se revelam interessantes à análise.

A primeira é de desvelamento da dinâmica do processo político a partir da ação do grupo protagonista na corrida eleitoral e que almeja o futuro exercício do poder. Sem desmerecer a personalidade e o papel de nosso querido presidente, a verdade é que o poder não é exercido por um indivíduo, senão por um grupo coordenado de pessoas. Esse grupo coordenador da campanha, que é de fato uma federação de outros grupos e interesses, age como em uma gincana, cujo prêmio, sabemos, é a faixa presidencial.

Além disso, o documetário é muito feliz ao revelar sutis passagens em que José Dirceu, Antônio Palocci, Duda Mendonça, Guchiquem e outros aparecem sem as máscaras das públicas aparições. Figuram retratados no contexto do papel que cada um desempenhava na equipe de campanha. Falas, olhares e gestos são reveladores da personalidade de cada qual.

Tudo bem, não nos esqueçamos do filtro que se estabelece nas autorizações para filmagens, nas cautelas dos retratados e no olhar do diretor. Mas ainda assim estão em evidência as pessoas. Algumas de extraordinário talento e capacidade.

Os desdobramentos sabemos: Lula é eleito e reeleito. Neste íterim enfrenta a crise do mensalão e do caixa dois de campanha. Aquela equipe de 2002 evapora. Mas novas políticas públicas e novos personagens terão entrado para sempre no cenário político nacional. Sob tal perspectiva o contributo histórico destas cenas é grandioso. Estou certo que seu novo e verdadeiro valor ainda se revelará daqui a algumas décadas. Só então saberemos se terá sido este um dos pontos de inflexão da história brasileira.

Por enquanto João Moreira Salles nos brinda com este prazer voyeur, tão em voga nestes tempos do deprimente Big-Brother global, de nos deliciamos com alguns olhares sobre aquela fantástica e decisiva ante-sala do poder.